terça-feira, 21 de agosto de 2012

Mais sobre Caixa preta, de Jennifer Egan (Editora Intrínseca)


 O que inspirou Jennifer Egan a estruturar Caixa preta em tuítes? *

Vários dos meus antigos interesses no campo da ficção convergiram para que eu escrevesse Caixa preta. Um deles envolve a prosa em formato de listas, histórias que parecem contadas inadvertidamente, como notas de um narrador para si mesmo. Tanto que o título provisório para o conto era “Lições aprendidas” e minha intenção era escrever uma história que tomasse forma a partir das lições depreendidas pelo narrador a cada passo da ação, em vez de ser apresentado pelas descrições do fato em si. Outro intento muito antigo era pegar um personagem de uma história realista e transportá-lo para um gênero diferente. David Wiesner foi o primeiro a incutir essa ideia em minha cabeça com a sua espetacular metaficção ilustrada “The Three Pigs”, na qual os três porcos se movem pelos desenhos e, a cada estilo de cenário em que eles entram, suas representações vão se transformando radicalmente. Imaginei se poderia fazer algo análogo com um personagem do meu romance A visita cruel do tempo: criar uma versão em quadrinhos daquele indivíduo, por exemplo — ou nesse caso, uma versão que fosse um thriller de espionagem. Também pensei em como seria escrever uma obra de ficção cuja estrutura permitisse a serialização no Twitter. Não se trata de uma ideia nova, claro, mas é algo muito rico — tanto por causa da peculiaridade de alcançar as pessoas em seus celulares como pela estranha poesia que pode acontecer em cento e quarenta caracteres. Comecei a imaginar uma série concisa de despachos mentais de uma espiã do futuro trabalhando disfarçada no Mediterrâneo. Escrevi essas anotações à mão em um caderno japonês com oito retângulos em cada página. O conto tinha originalmente o dobro do tamanho atual; levei cerca de um ano, intermitentemente, para trabalhar e ajustar o material que agora é o Caixa preta.



*Fonte: Mais sobre Caixa preta, de Jennifer Egan | Editora Intrínseca

Um comentário:

  1. Não li a Jennifer Egan, mas, depois de ouvir os comentários dos colegas sobre o livro dela, lembrei do que eu havia lido muitos anos atrás, no "A voz do escritor", do Alvarez. Ele fala que ESCREVER e LER são experiências particulares e intimistas, que ocorrem, assim como o pensamento, em silêncio. Para se escrever um poema ou mesmo uma frase autêntica, e para que se possa escutá-la de modo adequado, é necessário lê-la em voz alta, embora silenciosamente, na cabeça. Mas depois que o poema ou mesmo o texto em prosa está concluído, é lançado no mundo para encontrar seu público. Aí que o Razzmatazz (parafernália) entra em cena – a aritmética de vendas e toda a parafernália que gera com o objetivo de fazer do escritor uma personalidade vendável – e seus efeitos, na opinião dele, nas últimas décadas, tem sido cada vez mais perturbadores.
    Para Alvarez, o culto à personalidade trazido pelo Romantismo seria uma espécie de pai daquilo que Alvarez chama de Razzmatazz. Do século XVIII até hoje, esse culto só cresceu na opinião do autor.
    Ele acaba o livro "ensinando" aos que pretendem ser escritores:
    "(...) Criar vozes na mente do leitor, imagens no olho da mente, presenças imaginárias com vidas próprias, é uma habilidade intrincada e sutil, que exige autoconhecimento e despojamento – até mesmo modéstia -, assim como a fascinação do artesão pelo trabalho como se ele fosse algo com vida própria, independente daquele que o faz e de seu ego escandaloso. E esta não é uma imagem de artista que se destaque com facilidade numa era de showbiz, celebridades e propaganda, quando as pessoas estão menos interessadas na coisa, na obra, do que no que ela guarda para elas.
    (...) Sempre iremos conviver com arte ruim, o gosto é imprevisível, a fama não merece confiança e apenas a história, como dizem, será nosso juiz. Enquanto isso, é trabalho dos escritores criar vozes tão verdadeiras quanto puderem – pelo menos para mostrarem a si mesmos que isso pode ser feito, e na esperança de que alguém por aí esteja escutando."
    Para quem se interessar pelo livro:
    ALVAREZ, Alfred. A voz do escritor. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006.

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